O presidente da Associação dos Delegados de Polícia de Mato Grosso do Sul (Adepol/MS) falou dos trabalhos da entidade e do cenário atual dos delegados no Estado
Em entrevista nesta segunda-feira (8), o presidente da Associação dos Delegados de Polícia de Mato Grosso do Sul (Adepol/MS), André Matsushita, destacou a importância da integração e do uso da tecnologia de inteligência na Polícia Civil de Mato Grosso do Sul.
Ele mencionou a criação do projeto “Fala Delegado” para melhorar a imagem dos delegados e a utilização das redes sociais e grupos de WhatsApp para comunicação e atendimento às demandas.
Abordou também as incertezas decorrentes da decisão do STF de transformar o porte de drogas em infração administrativa, questionando a responsabilidade da Polícia Civil nesse contexto.
Além disso, enfatizou a necessidade de uma abordagem mais técnica e cuidadosa sobre o uso da maconha e propôs que, se há necessidade de monitorar policiais com câmeras, essa fiscalização deveria se estender a todos os servidores públicos para garantir equidade. Confira a entrevista na íntegra:
A Crítica: Como tem sido os trabalhos na Adepol/MS desde o início de sua gestão no ano passado?
Matsushita: Desde o início da gestão, elencamos alguns pontos-chave para trabalharmos. Temos focado na defesa das prerrogativas dos delegados, na melhoria salarial — recentemente alcançamos uma grande vitória nessa área — e na melhoria da imagem dos delegados de polícia perante a comunidade. Para isso, criamos o podcast “Fala Delegado”, que conecta a delegacia, a universidade e a comunidade em geral.
A Crítica: Essa questão envolvendo a aproximação da polícia com a população… Há alguns anos atrás essa proximidade era quase impossível. A que o senhor atribui isso?
Matsushita: Vivemos em um país onde, por diversas razões profundas que não temos tempo de discutir agora, a polícia não é enaltecida. O que vocês estão fazendo agora, nos trazendo aqui, é raro. Geralmente, somos retratados de forma truculenta e ignorante. Em novelas, por exemplo, os delegados são frequentemente mostrados como bêbados ou ladrões.
Essa imagem é repetida ao longo de anos e décadas, dificultando a mudança dessa percepção. Nosso desafio é modificar isso, e estamos trabalhando para trazer a faculdade e a comunidade para mais perto, criando um podcast “Fala Delegado”, acessível a todos. Queremos mostrar que o delegado é uma pessoa estudada, conhecedora e competente.
A Crítica: O delegado-geral de Polícia Civil de MS, Lupersio Degerone Lucio, destacou a importância de modernizar a instituição com o uso de tecnologia e inteligência policial. Quais são as iniciativas em andamento para poder implementar essa tecnologia? Estamos muito aquém de outros Estados?
Matsushita: Muito pelo contrário, Mato Grosso do Sul está na vanguarda da tecnologia de inteligência. Atualmente, enfrentamos duas frentes principais. A primeira é a questão dos equipamentos e softwares, que já foram adquiridos e estão em uso. A segunda é a capacitação. Precisamos desenvolver a doutrina do uso da inteligência na Polícia Civil, o que vem sendo feito há bastante tempo. Existe um departamento de inteligência, do qual fui diretor. Quando cheguei à polícia, havia apenas um núcleo de inteligência sendo criado. Hoje, temos um departamento completo. O uso da inteligência tem sido aplicado com bastante ênfase na Polícia Civil de Mato Grosso do Sul.
A Crítica: E isso traz muitos bons resultados para a população…
Matsushita: O profissional de inteligência é conhecido como “Soldado do Silêncio”. Ele trabalha sem ser visto. Portanto, quem atua na inteligência não pode ter a vaidade de querer aparecer. Muitas vezes, a delegacia ou a unidade recebe o crédito pela prisão, mas foi a inteligência que levantou todas as informações. O agente de inteligência não pode se expor, senão compromete seu trabalho. Aqui em Mato Grosso do Sul, temos uma inteligência muito potente, porque todas as instituições trabalham unidas.
A Crítica: Como vem sendo feito o trabalho de integração nas cidades?
Matsushita: Utilizamos bastante as redes sociais e grupos de WhatsApp para divulgar nossas ações e receber demandas de trabalho. Temos trabalhado muito com os delegados do interior dessa forma. Além disso, fazemos viagens para as regionais para conversar pessoalmente com os delegados, entender suas necessidades e levar essas demandas para a administração. A integração é essencial. Temos promovido a integração trazendo delegados do interior para a capital, acolhendo-os aqui e realizando eventos.
Matsushita: Isso é uma questão muito sensível e ainda não está claro como vai funcionar. A nossa Constituição Federal atribui à Polícia Civil a responsabilidade de apurar infrações penais. No momento em que o STF transformou o porte de drogas em uma infração administrativa, essa responsabilidade deixa de ser da Polícia Civil. E agora? O que fazer? Se alguém for pego com 40 gramas de maconha, para quem vamos levar? A Polícia Civil não pode lidar com isso, pois é inconstitucional.
Isso pode causar um caos. Com 40 gramas de maconha, é possível fazer 133 baseados. Quem consegue fumar tudo isso em uma noite? Isso traz muita preocupação, pois ninguém sabe como proceder. Continuaremos atuando da mesma forma, mas será questionado, já que não é atribuição da Polícia Civil apurar infrações administrativas. Esse dinheiro vai para o tráfico, para comprar mais armas e corromper mais pessoas.
Precisamos pensar com calma e tecnicidade. Quem vai receber essas 40 gramas de maconha daqui para frente? Ou a Polícia Civil terá que apurar infrações penais e administrativas? Essas são dúvidas importantes que a sociedade precisa considerar.
A maconha não é inofensiva, não é como um copo d’água. Precisamos abordar isso com muito cuidado e reavaliar a situação.
A Crítica: A segurança de Mato Grosso do Sul segue sem previsão de adotar câmeras nos uniformes dos policiais. A Adepol/MS é favor ou contra a medida?
Matsushita: Pense bem, se alguém precisa usar câmeras para monitorar e fiscalizar suas ações, deveria ser todos os servidores públicos. Todos devem obediência à lei e têm suas atribuições regulamentadas, então todos podem cometer erros. Se vamos exigir câmeras para fiscalizar o que o policial faz, essa regra deveria se aplicar a todos os servidores públicos, desde quem está na portaria até os mandatários. Todos têm a mesma missão: trabalhar conforme a lei. Colocar câmeras apenas nos policiais cria uma dicotomia, parece esquisito. Se queremos fiscalizar, devemos fiscalizar todos os servidores públicos.